Obras da artista belga Berlinde De Bruyckere

sábado, 4 de setembro de 2010

Orfandade crítica


De todos os estudantes de artes visuais e história da arte autores desse blog, eu sou reconhecida (e assumida) como a mais cri-cri. Não poderia ser diferente tendo eu, desde o primeiro dia na faculdade, posto a cara a tapa dizendo que "não gostava de arte contemporânea", e me posicionando contra certas "obras" que eu não entendia por que eram consideradas arte. Decorridos dois anos e meio, já ficou claro (espero!) que é óbvio que eu não rejeito, e nem poderia rejeitar, a arte contemporânea em si, ou na sua totalidade, mas que, sim, eu sou resistente ao tal do "vale-tudo"; uma posição que, na realidade crítica atual, me faz sentir meio órfã. Isso porque, no cenário artístico contemporâneo, a crítica parece ter sido mandada para uma espécie de limbo.

Não lembro se li ou se ouvi de professores que em algum momento depois dos anos 1970, a crítica de arte foi perdendo espaço nos jornais e se tornando uma atividade ligada à academia. De fato, nos jornais de hoje parece que só sobrou o "mal-humorado" Ferreira Gullar, aos domingos, no caderno "Ilustríssima" da Folha de São Paulo, e o "sensacionalista" Luciano Trigo, no "Máquina de Escrever" do portal G1. Ainda assim, Gullar fala mais de poesia e política, raramente tratando de arte; e Trigo, além artes visuais, divide as atenções com cinema e literatura. Curiosamente, os dois são conhecidos por fazerem críticas negativas à arte contemporânea, e eu, na minha tendência indomesticável, gosto de ler os dois.

O pensamento que quero propor a vocês com esse post é: que crítica é essa que passou a existir depois de formar vínculo com a academia? Por que essa crítica, dos livros e das publicações, parece só endossar e não faz críticas negativas? Não pergunto na intenção de disseminar nenhuma "sementinha do mal", mas é que, se não leio Gullar ou Trigo, fico sem nenhuma referência sobre o que talvez seja "arte ruim", pois esse esvaziamento da crítica que aponta problemas, que põe o dedo na ferida, somado ao excessivo relativismo com que somos doutrinados, acaba fazendo parecer que não há o que criticar negativamente.

Será?

Postado por Erica Tulip.

4 comentários:

  1. Sofro com questões desta ordem também...Mas me convenço a cada dia, a cada aula, que o conhecimento serve para nos tornar perspicazes, acender a vontade de indagar, de se aprofundar, de rever conceitos.
    Acho que a crítica que não acetia facilmente uma obra proposta é fruto de um exercício. O exercício da não aceitação, ou da não obrigação de aceitar a obra, o sistema, a vida, como eles se propõe sempre.
    É dificil... O desaparecimento de uma geração que tinha opiniões e lutava por elas (durante uma ditadura militar!), seguiu-se pelo surgimento de uma geração (provavelmente a nossa) que goza de liberdade de expressão e não a usa para fazer a crítica que revela o negativo, ou o não dito, das coisas.
    A competitividade no mercado, o medo na busca pela sobrevivência, o comodismo, a "opiniao dos internautas", etc.,tudo isso faz com que nós precisemos ser aceitos pelo outro (a epresa, o leitor, o cliente...) o tempo todo.
    É a geração que precisa concordar.
    Para a função do crítico, esse movimento conservador, de querer se "enquardrar", que vai na contra corrente da liberdade adiquirida, é o fim...
    Ou o recomeço.

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  2. Faltou um "m" em "propõe" na quarta linha. Sorry!

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  3. Faltou um "m" em "empresa" na 9ª linha. Porra!

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  4. ÓTIMO post, Erica.

    Concordo com Marina e repito o que ela disse: "o conhecimento serve para nos tornar perspicazes, acender a vontade de indagar, de se aprofundar, de rever conceitos".

    Fico feliz por você ter escrito. Isso demonstra que você quer saber o que acontece, quer pensar sobre o assunto e, ao que me parece, não tem um pensamento fechado.

    Confesso: às vezes tenho vontade de colocar você e Leo no colo. É que parece que vocês sofrem muito com essa coisa louca da "contemporaneidade", mas................. vivemos na contemporaneidade. E ela é ótima! "Só" precisa de um ajuste na sintonia fina. =)

    Pensei numa coisa... de repente a crítica de arte também sofre com uma talvez "banalização". Assim como a arte sofre com o "tudo é arte" e "todo mundo é artista" (eu acredito nessas expressões, mas acho que foram mal interpretadas), talvez a crítica sofra com um "todo mundo é crítico".

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